EMBRIÕES DO PODER POPULAR? UM ESTUDO COMPARADO DAS EXPERIÊNCIAS AGRÁRIAS DE TRABALHO E EDUCAÇÃO NO BRASIL E VENEZUELA
Esta pesquisa se insere no debate sobre o projeto destrutivo do capital e as alternativas de trabalho, educação, cooperação e auto-organização do campesinato latino-americano. A pesquisa se desenvolveu em dois países: Brasil e Venezuela, em territórios rurais, onde foram acompanhadas duas experiênc...
Guardado en:
Autor principal: | |
---|---|
Formato: | article |
Lenguaje: | EN ES FR PT |
Publicado: |
Universidade Federal Fluminense
2021
|
Materias: | |
Acceso en línea: | https://doaj.org/article/e5465891c9144d11ad7c8949d3ec8049 |
Etiquetas: |
Agregar Etiqueta
Sin Etiquetas, Sea el primero en etiquetar este registro!
|
Sumario: | Esta pesquisa se insere no debate sobre o projeto destrutivo do capital e as alternativas de trabalho, educação, cooperação e auto-organização do campesinato latino-americano. A pesquisa se desenvolveu em dois países: Brasil e Venezuela, em territórios rurais, onde foram acompanhadas duas experiências agrícolas nos Assentamentos Rurais da Reforma Agrária do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no Brasil e duas experiências nas Comunas Socialistas (CS), ligadas ao Movimento Comunero na República Bolivariana na Venezuela.
A pesquisa teve como objetivo principal analisar em que medida a luta política travada pelos trabalhadores e trabalhadoras camponeses desenvolve consciência de classe, auto-organização e experiência na organização política na perspectiva da emancipação humana, autogestão e do poder popular. A partir deste objetivo, levantamos diversas indagações, tais como: de que forma tais experiências tentam romper com a conhecida cisão entre concepção e execução do trabalho? Como a auto-organização dos trabalhadores e trabalhadoras se relaciona a um projeto alternativo ao capitalismo? As experiências apontam para algo além do conhecido desenvolvimentismo?
Questionamos também quais são os aspectos e elementos que evidenciam que as experiências de produção ecológicas dos assentamentos do MST e das comunas agrárias bolivarianas, inseridas na proposta do Socialismo do século XXI, têm sido aquilo que se contrapõe: oposição aos modelos produtivos do agronegócio e do rentismo? Mas o que há em comum entre Brasil e Venezuela? Porque a escolha da Venezuela, se essa não se trata de um país tipicamente agrário? Quais paralelos comparativos seriam possíveis entre Assentamentos e Comunas?
O critério que nos levou a escolha dessas experiências foram algumas razões: a primeira dá-se pela expressão do que a experiência do MST e os Conselhos Comunais Venezuelanos vêm representando nos últimos anos e a segunda porque ambas as experiências populares partem de concepções chave desta investigação, quais sejam: a soberania alimentar, cooperação, a autodeterminação dos povos e o poder popular.
A metodologia da pesquisa consistiu na perspectiva teórica do Materialismo Histórico Dialético (TRIVIÑOS, 1987; KOSIK, 2011), no campo da pesquisa qualitativa em educação (LÜDKE, 1986), delimitando-se um estudo comparado (FRANCO, 1992; 2002; 2009). Os procedimentos metodológicos envolveram revisão de literatura, análise documental, levantamento de dados primários e secundários, fase exploratória e trabalho de campo. O trabalho de campo foi realizado nos assentamentos: Capela e Filhos de Sepé, na Região Metropolitana de Porto Alegre/RS e nas Comunas Socialistas: El Maizal e Che Guevara localizados nos municípios de Simón Planas e Caracciolo Parra Olmiedo.
O levantamento de dados variou entre os anos de 2016 a 2020, o primeiro constituiu-se na fase exploratória e o segundo no trabalho de campo e a coleta de dados finais, para realização da coleta de dados, foram utilizadas primordialmente as entrevistas semiestruturadas. Também, de forma complementar, a observação participante, que foi realizada com o intuito de observação das diversas interações nos espaços pesquisados. E ainda tivemos como apoio o diário de campo, que teve o objetivo acompanhar as atividades, reuniões e assembleias. O diário de campo auxiliou nas anotações e memórias dos procedimentos e interações cotidianas dos assentamentos e das comunas.
O trabalho está estruturado em quatro capítulos. No primeiro capítulo, buscamos trazer o debate sobre o método de pesquisa e os acúmulos epistemológicos, além das imersões nos campos de pesquisa, para os processos metodológicos do estudo comparado, o capítulo também busca resgatar as contribuições da atualidade (estado da questão) sobre as questões agrárias e as experiências cooperativadas a partir de buscas em periódicos, eventos, etc.
No segundo capítulo, tem por objetivo discutir o papel do estado, do cooperativismo e da construção do poder popular e resgatar duas das principais experiências do chamado controle operário: a primeira experiência de poder da classe trabalhadora, a Comuna de Paris e a experiência dos Sovietes na Rússia. Além do debate das experiências de construção do poder dos trabalhadores, abordamos brevemente o papel da educação na construção da consciência socialista durante os processos revolucionários.
No terceiro capítulo, recupera o desenvolvimento histórico da questão agrária no Brasil e na Venezuela demonstrando as fases de dominação imperialista do capital sobre a terra e o trabalho e as propostas de desenvolvimento que foram sendo gestadas nos países investigados. O quarto capítulo, consiste nas análises dos espaços investigados no Rio Grande do Sul/RS: a) Assentamento Capela; b) Assentamento Filhos de Sepé; e na República Bolivariana da Venezuela: a) Comuna Socialista El Maizal; b) Comuna Socialista Che Guevara Mesa Julia.
E, por fim, os resultados e considerações finais desta investigação sustentam a hipótese formulada e demonstram que embora permeadas de contradições, as experiências investigadas, indicam “janelas” que apontam alternativas viáveis para problematizar “as estratégias anticapitalistas e os instrumentos políticos que permitem construir o poder popular do século XXI”. Constroem, assim, na atualidade um importante farol de resistência dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo e da cidade.
As experiências de produção ecológicas de arroz do MST e as Comunas Agrárias República Bolivariana da Venezuela, inovam ao invocar na práxis do trabalho cooperativo, a agroecologia o poder popular e a auto-organização dos trabalhadores e trabalhadoras. Revelam o caráter essencialmente contraditório do capital, demonstram à possibilidade da construção de resistências ao modelo do agronegócio e ao rentismo petrolífero, bem como engendram processos educativos que sinalizam saltos qualitativos no âmbito da formação humana e da autogestão, pelos processos de coletivização dos meios de produção, que envolvem múltiplas técnicas e o conhecimento relativo tanto ao planejamento quanto à execução das atividades, contribuem para a construção do poder popular nos territórios investigados.
Assim, conclui-se que: a) embora as experiências pesquisadas não eliminem a alienação do trabalho, a propriedade e a posse dos meios de produção, o trabalho em seu sentido ontológico, a educação politécnica e a ciência agroecológica trazem para os trabalhadores/as a possibilidade de articular os saberes que a organização capitalista do trabalho fragmentou; b) os processos educativos com novas culturas do trabalho, novas matrizes produtivas forjam na práxis da produção coletiva novas relações de organização, produção, educação e insubordinação; c) Sobre o protagonismo das mulheres e o poder popular, nos assentamentos do MST verificamos a ampla participação permanente das mulheres, na liderança das frentes produtivas de panificação e comercialização nas feiras agroecológicas, enquanto que, na Venezuela a participação das mulheres nas experiências de produção social e na direção dos processos políticos é bastante impactante. Conforme dados de Obediente e Arena (2017, p. 171): “en la construcción del Poder Popular interviene mayoritariamente un género: las mujeres; más del 60% de los consejos comunales están integrados e impulsados por mujeres”; d) de modo geral, pode-se evidenciar que o Movimento Comunero avança com a Ofensiva Socialista na construção do Estado Comunal na República Bolivariana da Venezuela. Enquanto o MST, em graus diversos, consegue se colocar como uma alternativa de “resistência ativa” para o campesinato gaúcho, a partir da experiência do “conglomerado de produção ecológica” (MARTINS, 2019).
|
---|